A INFLUÊNCIA DO JUDAÍSMO NA IMAGEM CRISTÃ
O Judaísmo constitui a raiz e a base do
cristianismo. É no contexto judaico que o cristianismo se desenvolve. Jesus era
judeu, assim como os Apóstolos. A atitude judaica diante da imagem é, em geral,
negativa. O judaísmo é uma religião anicónica, a imagem era vetada, a própria
Torá proibia a confecção de imagens. Deus não pode ser representado porque é o
Totalmente Outro, o Deus Todo Poderoso, o Indizível e o Impronunciável. Essa
proibição é baseada no Livro do Pentateuco: “Não terás outros deuses diante de mim. Não farás para ti imagem esculpida
de nada que se assemelhe ao que existe lá em cima nos céus, ou embaixo na
terra, ou nas águas que estão debaixo da terra” (Ex, 20,3-4); mas Êxodo 20,
23 e Deuteronômio 27,15 parecem limitar esta proibição à representação dos
deuses, isto é, dos ídolos. De fato, no judaísmo, nem todas as representações
figurativas eram proibidas, como mostra o episódio da serpente de bronze (Nm
21,4-9) e, sobretudo, as ordens da confecção dos querubins na Arca da aliança: “Farás dois querubins de ouro, de ouro
batido os farás, nas duas extremidades do propiciatório” (Ex 25,18), ordens
que se repetiram na construção do Templo de Salomão (1Rs 6,23).
A proibição das imagens visava preservar o povo de
Israel do perigo da idolatria.[1]
Mas, em geral, a cultura judaica se mostrava tolerante com as imagens, prova
disso é a descoberta, no próprio território de Israel, da Beit Alpha, uma sinagoga do VI século decorada com mosaicos
representando a Arca da aliança, os signos do zodíaco, o sacrifício de Isaac,
etc.
Os judeus da diáspora, sobretudo, viviam em um
ambiente cultural onde a imagem exercia uma função de grande importância e,
portanto, eram mais abertos à aceitação da imagética religiosa. O exemplo mais
célebre é a Domus Ecclesiae de Dura-Europos, (Mesopotâmia, séc. III
d.C.), na atual Síria do Norte, onde são representados inteiros ciclos de histórias da Bíblia: a
história de Moisés, de Elias, de Daniel e outros personagens do Antigo e Novo
Testamento. A Domus Christiana de Dura-Europos é a primeira casa utilizada
exclusivamente para o culto cristão que chegou até nós. Situada perto do rio
Eufrates, foi fundada, provavelmente, pelos macedônios de Alexandre Magno.
Conquistada pelos romanos tornou-se uma guarnição militar. Depois da invasão
persa foi abandonada (256-257 d.C.).
Dura Europos
serviu para diversas funções religiosas. Hospedou inicialmente cultos pagãos,
depois se tornou uma Sinagoga judaica e uma Igreja cristã. Uma característica
importante da Domus Christiana é o
batistério com os seus belíssimos afrescos que nos transmitem informações
preciosas sobre a arte e a vida daquela época. Aos poucos foi se estruturando
um lugar de culto específico e não mais improvisado, um edifício público de
culto e não mais um edifício privado. Depois que o cristianismo tornou-se a religião oficial do Império o
espaço sagrado para o culto sofreu uma ulterior evolução. Alguns edifícios da
administração pública, geralmente usados como tribunais, foram utilizados como
edifícios de culto. Assim, nascem as primeiras Igrejas, as Basílicas. A Domus Christiana de Dura Europos e as Catacumbas Romanas
são as atestações arqueológicas mais antigas que conhecemos e por isso de
extrema importância para o estudo da iconografia cristã. “A tradicional tese segundo a qual os cristãos das origens tinham
herdado do mundo judaico uma total rejeição das imagens não pode mais ser
sustentada hoje”.[2]
A proibição da norma veterotestamentária de
confeccionar imagens tinha sido aplicada com descontinuidade ao longo da
história judaica. Nos períodos de efetivo perigo de contaminação com os povos
idolátricos se afirmava a interdição absoluta, em outros momentos se
manifestava uma certa liberdade.
Historicamente os cristãos não esperaram o Edito de
Constantino (313) para criar pinturas destinadas a ilustrar os mistérios da
nova religião. A proibição do judaísmo foi rapidamente superada porque os
cristãos entenderam cedo que a imagem desenvolvia um papel fundamental na
propagação do cristianismo e o mandato missionário de Cristo era um imperativo
categórico para a nova religião. A própria proliferação de imagens é prova
eloquente da superação, por parte dos cristãos, das proibições do Antigo
Testamento e do perigo da idolatria.
Pe. Saverio Licari
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