Toda a arte cristã deve ser lida e interpretada a partir do símbolo: todo o objeto representado tem um significado abstrato. A arte paleocristã não narra, não expõe histórias com um sentido lógico e cronológico, expõe ideias que devem ser compreendidas a partir da contemplação visual de uma imagem: quando se representa a figura de Cristo, de Maria ou dos santos, não se quer reproduzir o contorno real, humano, mas se quer expressar o significado que eles assumem para os fiéis. Nesses casos, não se trata de forma alguma de pinturas históricas, de lembranças fotográficas de acontecimentos passados, mas de tornar apreensível a realidade de Deus no mundo, uma teofania de Deus em cores e formas.[1]
Por isso, o ícone é uma imagem sui generis que precisa ser compreendida a partir da espiritualidade e da realidade onde nasce. A noção de eikón abrange múltiplos aspectos do conhecimento humano, é preciso adentrar-se em suas raízes, na etimologia da sua palavra e na própria origem do homem para entendermos o seu significado.
Ainda hoje, nós ignoramos o início da arte, da pintura e da própria linguagem. No passado, a atitude em relação à pintura e às estátuas era em geral semelhante: não as consideravam meras obras de arte, mas objetos que tinham uma função definida. Seria insensato pensar que o homem da caverna construísse objetos, utensílios e pintasse imagens ignorando a finalidade para a qual tinham sido confeccionadas. Os povos primitivos se abrigavam nas cavernas para se proteger do sol, do vento e da chuva e, também, dos espíritos que geravam, segundo eles, tais eventos. As imagens eram feitas para protegê-los de outros espíritos ocultos e misteriosos que, para eles, eram tão reais quanto os fenômenos da natureza. A pintura e a estátua serviam para apropriar-se, de uma certa forma, da entidade desconhecida. Uma mediação, poderíamos dizer, entre o mundo que eles experimentavam e o oculto que fugia dos seus sentidos. Em outras palavras, o homem primitivo faz das imagens pintadas nas paredes das cavernas um meio para estabelecer um contato com o mundo divino e misterioso. A pintura rupestre tinha a função de tornar real e palpável o sujeito representado. (Se pense as cavernas de Lascaux na França ou de Altamira na Espanha, c. 15.000 – 10.000 a.C.). pe. Saverio Licari
Cf. BERGER, Rupert. Dicionário de liturgia pastoral. São Paulo: Loyola, 2010. p. 189.